Qual
é o limite para nos ocuparmos dos problemas ou sofrimentos das outras pessoas?
Esta é uma pergunta muito complexa, pois cada caso pode inspirar uma reflexão e
uma resposta própria.
De
um modo geral, podemos dizer que há situações de sofrimento que decorrem de
nossas próprias escolhas, mas há outras que emanam dos comportamentos de
pessoas ligadas a nós, como familiares ou amigos próximos.
Podemos dizer que o
ideal é que cada pessoa resolva seus próprios problemas; que cada um se acerte
com as consequências das próprias ações; que todo sujeito seja autônomo na
condução da própria vida.
Na prática, as
coisas não acontecem bem assim. Primeiro, porque muitos problemas são, no
momento em que estão ocorrendo, maiores que nossa capacidade de resolvê-los, ou
seja, é razoável que no decorrer da vida enfrentemos situações que demandem
apoio e ajuda de pessoas mais experientes e maduras; segundo, porque vivemos em
coletividade e as circunstâncias da vida não nos afetam de modo isolado.
Podemos partir deste
ponto: é legítimo que os problemas de uns afetem os outros e que haja uma corresponsabilidade
para a busca de soluções para tais situações. Até certo ponto isso é aceitável
e necessário para que construamos uma cultura de solidariedade.
O desconforto advém das situações que extrapolam o limite da
razoabilidade estando marcadas por sinais de patologia ou da fala de real
interesse pelo outro, ou seja, há pessoas que buscam as outras para resolverem
problemas que dariam conta de resolver e que constituem sua exclusiva parcela
de responsabilidade pela própria vida.
Ninguém pode ou deve se sentir responsável, além do limite, pelos
problemas do outros. Cada pessoa é responsável por sua vida, mesmo quando se
esconde por trás da fragilidade emocional ou de eventuais situações de um
passado traumático. Em outras palavras, cada pessoa é autora da própria vida e
da própria história, mesmo quando faz delas algo sem brilho. Justificar ou
transferir para outros as razões de ser da própria vida não faz de ninguém
menos responsável por tudo o que lhe acontece.
Por outro lado, há pessoas que aceitam o papel de carregarem fardos que
não são delas. Às vezes por culpa; às vezes por uma falsa compreensão do lugar
que ocupam na vida do outro; às vezes por acharem que desse modo estão
ajudando... de qualquer modo, carregar para o outro o fardo que ele dá conta ou
que é de sua exclusiva responsabilidade não
contribui com o amadurecimento, ao contrário, alimenta a imaturidade e,
por vezes, conduz a níveis mais profundos de problemas e até de doenças.
Na condição de familiares (especialmente mães e pais) ou de amigos
próximos, é preciso estabelecer, com clareza, o que constitui a vida e os
problemas do outro e não entrar no jogo desrespeitoso ou doentio que nos
envolve e seduz para carregar fardos que não são nossos. É necessário ter
coragem para “forçar” o outro a crescer; é preciso ser saudável emocionalmente
para dizer um basta e deixar o outro se construir autonomamente.
Quem carrega aquilo que pertence ao outro faz muito mal para si e para o
outro e, por uma questão de coerência com o que dissemos acima, não pode se
esquivar de assumir que é responsável por isso.
Se alguém não nos respeita impondo suas responsabilidades sobre nós; se
alguém está emocionalmente frágil ou doente, não é alimentando isso que iremos
ajudar, ao contrário, devemos superar a vulnerabilidade e deixar claro que cada
um deve carregar aquilo que compete a si, afinal, cada um tem uma vida. Então,
que cada um assuma-a.