Os Tempos Modernos trouxeram consigo
a certeza de que os antigos costumes e valores seriam descartados. O homem
moderno e, em certa medida o homem atual, nutriu a convicção de que a saída
para todos os problemas existenciais e sociais seria a inovação e o abandono de
todos os sinais que estiveram presentes nas tradicionais formas de viver.
Muita
coisa boa ocorreu com essa ousadia; muitas barreiras foram superadas; inúmeros
avanços em diversos campos da experiência humana e a sensação de que a vida
torna-se melhor, mais suave e mais amparada.
Por
outro lado, e sem muito receio, podemos constatar vários prejuízos, como o
individualismo, a falta de sentido para a vida, a sobreposição do ter em
relação ao ser e, como objeto dessa reflexão, a perda da noção de caráter.
Nenhuma sociedade
pode ser duradoura e consistente sem desenvolver em seus membros a capacidade
de agir com caráter. O caráter é o conjunto de elementos que transpassam a
personalidade e fazem do respeito um valor inegociável.
O
caráter não é algo simples ou que se forma com facilidade. Ele depende da
conjugação de dois fatores especiais e interdependentes: a teoria e a prática,
ou seja, o caráter emerge na personalidade do indivíduo quando os adultos discursam
sobre a forma correta de se comportar, mas também praticam comportamentos
adequados.
A
construção do caráter, portanto, depende de um árduo trabalho de educação e
convivência que leve o indivíduo em formação a perceber a supremacia de alguns
valores, e mais: a compreender que tais valores devem ser observados e
vivenciados independentemente de quaisquer ganhos ou negociações, pois são
valores em si mesmos, ou seja, uma pessoa de caráter age corretamente pelo
simples fato de ter percebido que essa é a forma de agir e não porque vai obter
algum retorno ou “pagamento” pela ação correta.
O
caráter se forma quando pais, educadores e líderes religiosos vão ensinando às
crianças, por meio de palavras e exemplos, a importância da honestidade; a
grandeza da solidariedade; a necessidade da tolerância/respeito a todo tipo de
diferença; a capacidade de não julgar e de não falar mal dos outros; a beleza escondida
na diversidade humana... o caráter brota na personalidade quando ensinamos às
crianças que a dor que dói no outro doeria em mim também! Que o respeito pelo
outro reflete o respeito por mim mesmo, não sendo possível haver respeito em
relação a mim se deliberadamente falto com o respeito em ralação ao outro.
A
formação do caráter não está fora de moda e não pode ser encarada como algo
superado pelas inovações modernas. Precisamos de homens e mulheres de caráter. Continuamos
tendo muita necessidade de pessoas que não sintam vergonha de se posicionarem
diante de injustiças e desonestidades. Faz-nos falta pessoas que tenham coragem
de escolher um comportamento reto, que fujam do relativismo, o qual, ironicamente,
absolutiza a ausência de caráter como regra de convivência.
A
responsabilidade pela formação de uma geração que tenha caráter é dos adultos e
deve ser exercida de modo compartilhado pela família, pela escola, pela
religião e por todas as instituições e pessoas que estão comprometidas com uma
sociedade melhor.
Viver
em uma sociedade em que as pessoas têm caráter é mais vantajoso. O mau-caratismo
gera insegurança ou cria uma falsa sensação de bem-estar, mas nenhuma sociedade
vive bem quando se institucionaliza a falta de caráter, pois o ganho que se tem
com a ação sem caráter é momentâneo e mascará uma dura realidade: os sujeitos
ativos e passivos dessas ações mudam de lugar com muita facilidade e,
geralmente, não gostamos quando somos a vítima.
Caráter
não é uma questão de moda ou de gosto. Caráter é essencial.