É comum vermos análises que partem
desse binômio: ser/ter. De um modo geral, tais reflexões atribuem a questão da
essência ao conceito de ser e ao ter são atribuídas as preocupações
materialistas. É relevante essa metodologia.
Nesse artigo, todavia, busca-se fugir
um pouco da visão clássica, especialmente no que diz respeito às associações
realizadas em torno do ter, pois
antes desse conceito vincular-se às expectativas financistas, expressa a forma
como estabelecemos nossos relacionamentos com o mundo e com as pessoas.
Somos convencidos de que precisamos
ter bons relacionamentos, ter bons amigos, ter pessoas de bem à nossa volta...
Pouco se faz o discurso de que devemos ser tudo isso para as pessoas. Ser bons
amigos, ser bom nos relacionamentos!
Os discursos promovidos pela cultura
pós-moderna acabam nos convencendo a praticar um egocentrismo velado e
perverso, pois continuam colocando o individuo no centro de todos os processos
sociais e criando falsas sensações de êxito sob o pretexto de que devemos
construir uma sociedade politicamente correta. Muitas vezes essas proposições
são frágeis porque não indicam a responsabilidade pessoal e individual que cada
um precisa assumir, ao contrário, permitem a falsa sensação de que apenas os
outros devem fazer suas partes.
Por trás de slogans de grandes
empresas, de certas manifestações religiosas, de tantas campanhas publicitárias
esconde-se uma velha e macabra isenção do indivíduo por suas ações e uma
equivocada percepção do papel de cada pessoa na construção de uma sociedade
melhor.
Acreditamos que as pessoas precisam ter mais tolerância e educação no
trânsito, muitas vezes, porém, não entendemos que isso implica que nós mesmos
precisamos ser mais educados e
tolerantes.
Compreendemos bem que o estado e a
sociedade têm diversos deveres para
com o cidadão, mas não nos percebemos como seres
de deveres; ora, na medida em que tenho
direitos, sou sujeito de deveres.
Sabemos que a lealdade é uma virtude
importante e cara, por isso mesmo, queremos ter
amigos leais; mas precisamos praticar essa mesma lealdade: preciso ser um amigo leal e não apenas querer ter um amigo leal.
Por uma questão de coerência e por
fidelidade ao desejo de construirmos um mundo melhor, devemos empreender uma
busca equilibrada do ser e do ter:
Quem quer ter o respeito das pessoas precisa ser respeitoso com todos: quem quer ter amigos leais, precisa ser
leal amigo;
Quem quer ter um ambiente (trabalho, Igreja, casa) alegre e pacífico precisa ser pacífico e alegre nos lugares onde
vive;
Quem espera ter representantes (políticos!) honestos e comprometidos precisa ser uma pessoa honesta e comprometida...
Faz parte de nossas responsabilidades
assumirmos nossa parcela na construção daquilo que queremos ter. É imperativo, portanto, que nosso ser se aproxime o máximo possível
daquilo que esperamos ter. É preciso ser para ter!