A filósofa Hannah Arendt, ao tratar
da condição humana, defende que o ser humano relaciona-se com o mundo a partir
de três possibilidades: labor, trabalho e ação.
Por labor a filósofa entende o universo da
sobrevivência. Todo esforço realizado pela natureza humana para garantir a
subsistência física do ser humano sobre a terra. No exercício do labor é
precário o grau de humanidade e pequena a distância que separa o ser humano dos
demais animais.
No plano
do trabalho ocorre uma evolução, os
seres humanos, no uso de sua racionalidade, alteram o mundo natural e criam
novos mundos para si. O esforço humano, neste caso, torna a vida mais suave e
confortável; os mundos criados interagem com as pessoas e contribuem com a
construção de sentidos para a vida.
A ação, terceiro estágio de relação do
homem com o mundo, é diferenciada. Por meio da ação o ser humano se reconhece,
não somente como criador de cultura, mas se percebe como ser capaz de gestar os
melhores significados para a existência. É na ação que efetivamente ocorre o
desvendar do que há de melhor no humano.
No mundo
da ação há espaço para o exercício da criatividade: característica
decisivamente humana. As pessoas saem da condição de meros sobreviventes e de
simples reprodutores de mundos criados previamente para o lugar de protagonismo
de suas próprias histórias. As pessoas que agem são, neste sentido,
compreendidas como capazes de criar mundos novos.
Nossa
época vive o constante risco de evolução para o lado contrário do processo, ou
seja, o risco de regredir ao invés de evoluir. Quando a relação com o mundo
impede e inviabiliza a criatividade – mundo da ação – e faz com que o
trabalhador tenha, na experiência do trabalho-labor, apenas (esse ‘apenas’ aqui
deve ser visto como exclusivo) o meio de subsistência; quando a possibilidade
de exercer a criatividade é completamente negada ao trabalhador, pode estar
havendo um processo de desumanização das pessoas.
A
correria exagerada de nossa época; o viver praticamente para trabalhar –
entendido como o fazer aquilo que o patrão manda -; a impossibilidade de
exercer, no trabalho, qualquer capacidade relacional e criativa, fazem com que
gestemos uma sociedade menos humana. A lógica liberal-capitalista, sob a
desculpa da evolução humana, segura uma grande parte da população no plano do
labor.
Há alguns
caminhos capazes de minimizar os riscos de desumanização que nos rodeia, entre
os quais, dois se destacam: o primeiro é recolocar no centro da vida a
importância das relações pessoais. Relacionar-se à moda antiga com as pessoas,
ou seja, pessoalmente e não virtualmente; bater papo, trocar informações,
contar/relembrar alguma história do passado e até debater algum assunto
polêmico são formas de humanização que fortalecem contra os efeitos da lógica
do labor que desumaniza.
Outro
caminho consiste na busca de melhor consciência do processo de mecanização e
controle definido pelo mundo do labor. Quem percebe que é tratado como máquina
no local de trabalho; quem se dá conta que não passa de um repetidor de ações;
que a vida no trabalho o aprisiona no mundo da subsistência começa a se
libertar para o mundo da ação.
É preciso
acordar: laborar, trabalhar e agir... subsistir, usufruir dos confortos que a
cultura produz e se relacionar como gente.
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